II Encontro Nacional de Gestores Municipais de Cultura
Brasília, 02 de Março de 2016
Manifesto de secretários e gestores municipais de cultura em defesa da CONDECINE e da produção audiovisual brasileira
Diante da liminar concedida pela 4ª vara da justiça federal do distrito federal ao Sinditelebrasil (Sindicato nacional das empresas de telefonia e de serviço móvel celular e pessoal) que suspende o recolhimento da contribuição para o desenvolvimento da indústria cinematográfica nacional (CONDECINE) por parte das empresas de telefonia móvel, entendemos que:
- O argumento do Sinditelebrasil de que a produção audiovisual e a telefonia celular são de setores distintos é irrefletido e infundado, haja vista, que o principal tráfego da banda larga nos celulares é de vídeo e que as empresas de telefonia também obtêm faturamento do mercado audiovisual ao explorarem serviços de TV por assinatura. O Brasil tem um ambiente institucional das comunicações com um desenho extremamente fragmentado entre Comunicação Audiovisual, Telecomunicações e Radiodifusão, cada qual regulado por um órgão diferente. Este ambiente tem uma preocupação notadamente maior com as condições técnicas e tecnológicas do que com os conteúdos e os fluxos. É neste panorama equivocado que se baseia a afirmação do Sinditelebrasil, mas não corresponde à realidade dos conteúdos e muito menos às necessidades de democratização das comunicações e aos princípios da convenção da diversidade das expressões culturais, ratificada pelo Brasil em 2007, e exigência do parágrafo único do artigo 3º da lei 12.485/2011.
- Sendo a CONDECINE responsável por 80% da arrecadação destinada ao fundo setorial do audiovisual (FSA), principal instrumento de fomento do audiovisual brasileiro, a produção do setor seria impactada negativamente e de forma contundente. Outrossim, o alcance do FSA vai muito além da produção. Entre 2008 e 2014, por exemplo, o FSA investiu r$ 961.019.867,00, dos quais 47,15% não se destinam à produção, mas programação, suplementação regional, inovação de linguagem, aquisição de direitos, comercialização, difusão e exibição. Estas ações garantem condições mais democráticas para o ambiente das comunicações no país e, consequentemente, promoção da diversidade cultural DO Brasil e NO Brasil.
- O custo da produção audiovisual é elevado, sendo o apoio, o financiamento e a suplementação imprescindíveis para a realização da maioria dos projetos nacionais, e esta foi uma das principais motivações da criação da CONDECINE, por garantir condições para maior participação da produção nacional no espectro da produção global distribuída no país. Como consequência direta, a produção audiovisual brasileira vem experimentando maior relevância e participação, mesmo num cenário de crise.
- Os programas revelando brasis, DOCTV, programadora Brasil, fundo setorial do audiovisual e usinas digitais e Brasil de todas as telas, entre outros, estariam seriamente comprometidos e com eles as ações de descentralização e regionalização da produção audiovisual, expressas em editais regionais e em parcerias com os municípios (editais de coparticipação).
- É possível compreender o quanto a produção regional seria impactada, observando os números referentes aos editais descentralizados[1] lançados no último biênio (2014-2015) pelo fundo setorial do audiovisual: 38 editais que juntos beneficiaram 282 projetos em todas as regiões do país, num aporte financeiro total de mais de r$ 155,4 milhões – destes 81,9 milhões do FSA e 73,5 milhões de contrapartidas dos estados e municípios.
- Anualmente, cerca de 300 longas-metragens e 400 séries e telefilmes deixariam de ser produzidos, afetando diretamente em torno de 700 empresas e inúmeros atores, diretores, técnicos, assistentes de produção, entre outros trabalhadores por elas mobilizados.
- A diminuição dos recursos impactaria na diminuição de conteúdo nacional e colocaria em risco a proteção e promoção da diversidade cultural em meio audiovisual e digital. O ambiente de acirrada competição, sem o suporte de políticas públicas consistentes num país de dimensões continentais, talvez não dê espaço para as produções locais.
- O questionamento por parte do Sinditelebrasil sobre a relevância da CONDECINE para o fomento da produção audiovisual não se sustenta, uma vez que o FSA tem um alcance muito maior que simplesmente a produção, como apontado anteriormente.
Dados os argumentos aqui apresentados, disponíveis para consulta e maior detalhamento no site da ANCINE – agência nacional do cinema (http://www.ancine.gov.br/), nós, secretários e gestores municipais de cultura, representando os diversos atores sociais locais envolvidos em todo o país, juntamo-nos à mobilização urgente para a cassação da referida liminar, ao preço de ver seriamente comprometido o importante salto quantitativo e qualitativo da produção audiovisual no Brasil.
Centro de Convenções Ulisses Guimarães
Brasília em 02 de Março de 2016.
[1] Editais descentralizados do FSA 2014-2015:
– 38 editais (18 com coparticipação de estados e 20 de municípios)
– 282 projetos suplementados (171 estaduais e 111 municipais).
– 155,4 milhões de reais investidos (R$ 81,9 do FSA e 73,5 de investimento local)
– 5 editais lançados na Região Norte (36 projetos suplementados), 11 no Nordeste (116 projetos), 5 no Centro Oeste (39 projetos), 12 no Sudeste (41 projetos) e 5 no Sul (50 projetos).