“No que se refere à política econômica, menos de 30% dos conselhos participativos têm realmente influência sobre decisões em relação ao orçamento do País”. Foi o que afirmou André Calixte, da Secretaria Geral da Presidência da República, em debate sobre as atuais negociações acerca dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável promovidas pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Representando o Grupo Interministerial de Trabalho para o Pós-2015, Calixte participou do Seminário “Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: o que está em jogo nestas negociações? – Análises e estratégias da sociedade civil”, promovido nesta quarta-feira (10), por Abong – Organizações em Defesa dos Direitos e Bens Comuns, em parceria com Artigo 19 e Fundação Friedrich Ebert (FES).
Na presença de diversos/as representantes da sociedade civil organizada, Calixte falou sobre a dificuldade do Estado brasileiro para consolidar um processo participativo simultâneo. Para ele, os conselhos de acompanhamento e consulta que existem nas áreas econômicas são, em sua maioria, comissões fechadas, enquanto deveriam ser mecanismos de participação. “Os processos participativos avançaram muito na área social, principalmente em relação a políticas públicas, mas ainda falta esse avanço no financiamento, na política externa e em questões fundamentais para o desenvolvimento de um país”.
Segundo ele, a SGPR é totalmente favorável à ampliação da participação social, mas é um processo que ainda está no começo e é submetido a alguns obstáculos, a exemplo da Política Nacional de Participação Social (decreto nº 8243), assinada pela presidenta Dilma em maio deste ano e atacada por partidos da oposição e parte da base do governo. “Há um muro que separa a burocracia estatal da sociedade formado pela estrutura social brasileira. Esta desigualdade da ação pública só pode ser quebrada com participação social e acreditamos que não é só uma questão de transparência, mas de modificar decisões e processos”, defendeu.
A discussão sobre participação da sociedade insere-se no atual contexto de definição dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que terá sua etapa final iniciada na 69ª Assembleia Geral da ONU, neste mês. Os ODS fazem parte da chamada “Agenda Pós-2015” que estabelece novos planos e metas para um desenvolvimento global depois do ciclo dos Objetivos do Milênio (ODM). (Leia mais aqui)
Neste contexto, a sociedade civil organizada disputa com governos e organismos multilaterais para que as novas metas contemplem seus interesses e, mais do que isso, para que sua participação nas decisões seja ampla e democrática. Para Alessandra Nilo, diretora estadual da Abong em Pernambuco, em discussões internacionais, o país deixa de se debruçar sobre questões fundamentais como, por exemplo, os Direitos Sexuais e Reprodutivos. “Nós entendemos que para entrar em consenso com todos os países seja preciso uma posição mediana, mas a impressão que tenho é que se não entramos no debate para avançar, mas para apenas evitar retroceder em algumas questões, já entramos perdendo”.
Em julho de 2014, o Grupo Interministerial de Trabalho para o Pós-2015 elaborou um documento com o objetivo de orientar as negociações dos ODS na Assembleia Geral da ONU. O texto incorporou comentários da sociedade civil recolhidos de dois eventos: “Diálogos Sociais: Desenvolvimento Sustentável na Agenda Pós-2015” (Rio de Janeiro, 2014) e “Arena de Participação Social” (Brasília, 2014).
Para Calixte, membro do GT, o documento é referência de participação social, sendo um dos primeiros a tratar de política externa que contém “influência pesada da sociedade civil”. Segundo ele, uma contribuição crucial feita pela sociedade civil foi a substituição da meta de combate à pobreza pelo combate às diferentes desigualdades. “A ideia agora é que a sociedade civil compreenda que o documento ainda está em construção, mesmo porque as negociações têm uma dinâmica própria e dependem de decisões feitas pelo Itamaraty. Mesmo assim, o esforço que estamos fazendo para levar temas para além da nossa agenda global, é muito importante. A agenda está avançando, ainda que, nacionalmente, isso pode não estar sendo percebido tão claramente”.
Para Nilo, é difícil para a sociedade civil perceber novas políticas voltadas para a participação de organizações e movimentos sociais quando faltam meios formais que garantam tal diálogo. Ela apontou, Inclusive, para o fato de não ter recebido nenhum documento ou relatório sobre as deliberações da Arena de Participação Social. “Uma coisa é a sociedade civil saber que nossas propostas são incorporadas, outra é termos real conhecimento disso. Ficamos na informalidade e isso é crucial nesta segunda fase de construção de indicadores para os ODS”.