Os primeiros 100 dias de mandato de um prefeito não chegam a 7% do período total da administração de um município, que corresponde a 1.460 dias. No entanto, esses pouco mais de três meses são o bastante para formar as primeiras impressões sobre o governo e definir a qualidade e as prioridades que ele terá.
É neste período que os executivos formam seu secretariado, tomam ciência da real situação da cidade e formulam as bases para o Plano Plurianual (PPA) que norteará as ações dos quatro anos seguintes. Em suma, nos primeiros cem dias plantam-se as sementes com maiores chances de florescer ao longo do mandato.
A transição, de candidato a prefeito, ocorre como parte relevante dos ritos. E, se na campanha é possível anunciar um rol de promessas, agora, ante a realidade da máquina pública, é crucial estabelecer prioridades que convirjam em ações concretas e direcionamento adequado para as principais políticas.
Pensando nos impactos das ações que ocorrem durante os primeiros 100 dias de governo e nos efeitos que um bom planejamento e o investimento eficiente de recursos podem ter para um munícipio, nós da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, defendemos que o investimento na Primeira Infância – período que vai do nascimento até os seis anos – podem gerar o melhor retorno.
De acordo com diversos estudos, esse retorno se dá na forma de mais riqueza – cidadãos mais bem formados produzem mais – e menos gastos: diminuição de taxas de crimes e vícios, por exemplo, e, por tabela, redução de gastos com saúde e seguridade social. Esse é, portanto, o momento de traduzir as promessas em práticas e de construir uma agenda ancorada nas crianças — priorizando as crianças pequenas.
Esses objetivos engendram a criação da campanha 100 dias: os primeiros passos pela primeira infância, que apresenta e disponibiliza para todas as prefeituras do país, instrumentos para planejar e realizar um mandato focado na melhoria do desenvolvimento infantil. Foram elaborados quatro guias focados em áreas determinantes para o desenvolvimento infantil (Educação Infantil, Gestão e Orçamento, Parentalidade e Saúde), com orientações e exemplos práticos de como os gestores públicos municipais devem agir nestes primeiros 100 dias de gestão, em favor da Primeira Infância.
Como exemplo, destaco algumas orientações presentes no guia sobre Educação Infantil: apurar a necessidade de vagas em creches e pré-escolas (o que falta); entender a distribuição dessas necessidades (para quem falta); avaliar a infraestrutura existente; mapear entidades sem fins lucrativos que possam ser parceiras na oferta de vagas; buscar financiamento para ampliação dessa oferta e adequar o quadro de profissionais na educação infantil.
Com esse mapeamento prévio, os gestores têm o desafio de ampliar, com qualidade, a oferta de vagas em creches de forma a atender à demanda das famílias e a universalização da pré-escola, tanto para garantir o ambiente adequado ao desenvolvimento de suas crianças, como para que as famílias possam trabalhar e, muitas vezes, para garantir segurança alimentar e proteção social. Na primeira infância, tudo é e deve ser integrado aos olhos do poder público e da sociedade.
A iniciativa traz ainda, um material exclusivo abordando os desafios que se colocam agora aos novos gestores, referenciando um estudo produzido pela Fundação com recomendações aos municípios no planejamento para retomada no contexto da pandemia de Covid-19, no momento adequado.
Além do contexto sanitário que se sobrepõe a tudo mais, ao falar da reabertura de escolas, no plano da gestão, duas perguntas se impõem aos tomadores de decisão: qual o custo da reabertura? Quem pagará a conta? Para ajudar a responder a essas indagações, a Fundação produziu também o documento “Custo da reabertura de creches e pré-escolas públicas no contexto da Covid-19”, com dados fundamentais para que os municípios possam se planejar para garantir que todas as unidades de educação infantil estejam devidamente preparadas para a retomada segura das aulas, quando as condições sanitárias assim o permitir.
Esses são os materiais que disponibilizamos na nossa plataforma Primeira Infância Primeiro no Município. Outras tecnologias e materiais estão sendo preparados e serão disponibilizados ao longo do mandato dos atuais prefeitos. A prefeitura estará mais bem equipada para resolvê-las se, desde já, tiver o foco, intenso e prioritário, nas crianças pequenas e suas famílias. Porque a experiências tem nos mostrado que as crianças são como um poderoso espelho: quando o foco está nelas, irradia para todos os lados, e por muito tempo.
* Heloisa Oliveira é economista e diretora de Relações Institucionais da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, com mais de 20 anos de carreira dedicados a questões sociais e da infância.