Dados levantados pelo R7 mostram aumento do número de lixões mapeados na última década; prazo para acabar estruturas é em agosto
De R7, por Edis Henrique Peres
O Brasil registrou um aumento de 21,1% dos lixões do país desde 2014. O aumento aconteceu mesmo com a meta estipulada pela Política Nacional de Resíduos Sólidos de extinguir todos os lixões até agosto deste ano. A Política Nacional, criada pela Lei nº 12.305 de 2010, foi discutida por mais de 20 anos no Congresso e é considerada um marco para o enfrentamento do problema dos resíduos sólidos. A lei determinava inicialmente o fim dos lixões até 2014, mas teve o prazo prorrogado para este ano.
Levantamento exclusivo feito pelo R7 no Sistema Nacional de Informações de Saneamento do Ministério das Cidades revela que os lixões mapeados aumentaram de 1.297 para 1.572 na última década. O aumento foi registrado principalmente entre os anos de 2019 e 2022.Questionada sobre um novo prazo para os municípios eliminarem os lixões, o Ministério do Meio Ambiente disse que não acredita no adiamento do prazo legal e adiantou que junto a “Secretaria-Geral da Presidência e outros ministérios do Comitê Interministerial para Inclusão dos Catadores, desenvolveu uma proposta de pacto humanizado pelo fim dos lixões”.
Segundo a pasta, a iniciativa tem apoio da “Atricon (Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil) e da Abrampa (Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente) e todas as associações de prefeitas e prefeitos e secretários municipais de meio ambiente, o que garantirá maior efetividade ao pacto”. A iniciativa deve ser anunciada em agosto de 2024, mas ainda não tem detalhamentos específicos.
O R7 procurou as organizações citadas, mas em resposta, as duas entidades afirmaram que o acordo ainda não foi firmado e que a construção do pacto está em fase de tratativas, sem definições oficiais.
Lixões no país
Dos 1,5 mil lixões monitorados pelo Ministério do Meio Ambiente, a maioria se concentra na região Nordeste, com 883 estruturas irregulares. A segunda região com maior ocorrência é o Norte (299), seguido do Centro-Oeste (231), Sudeste (134) e Sul (25) — veja dados por estado abaixo.O número de lixões do país, contudo, dobra na estimativa de organizações civis. O número levantado pela Abrema (Associação Brasileira de Resíduo e Meio Ambiente) é de pelo menos 3 mil lixões em funcionamento no país. A associação ainda aponta para 33,3 milhões de toneladas de lixo descartados de forma incorreta por ano, com uma média de 380 kg de resíduos sólidos produzidos por habitante do país a cada ano.
Para a ABM (Associação Brasileira de Municípios), a meta de extinguir os lixões é impossível de ser cumprida pelos municípios sem articulação do governo federal e dos governos estaduais. “Apesar do Congresso ter deliberado sobre a necessidade de encerramento dos lixões, não houve nenhum outro movimento, seja por parte do Congresso, governo federal ou estadual, para financiar, mapear ou ajudar os municípios do país”, diz Eduardo Tadeu, diretor-executivo da ABM.
Tadeu explica, por exemplo, que grande parte dos 5.568 municípios brasileiros não conta com recursos suficientes para montar seus próprios aterros.
Na nossa avaliação falta dinheiro do governo para que os aterros sejam criados. São municípios pequenos, às vezes com menos de 20 mil habitantes, e não é razoável supor que esses municípios vão conseguir construir aterros sanitários no seu território. É necessário consórcios e parcerias para que essas estruturas sejam montadas.
(EDUARDO TADEU, DIRETOR-EXECUTIVO ABM)
O diretor-executivo da Associação ainda acrescenta que extinguir os lixões não pode ser a única solução adotada. “Também precisamos mapear onde estão esses lixões, fazer estudos de impacto ambiental para a construção de aterros sanitários, e o município não pode arcar com isso sozinho, esse papel é do governo estadual. Outra preocupação é que o fim desses lixões seja feito de forma humanizada, pois neles vivem catadores de material reciclado que dependem desses espaços para ter renda”, diz.
Tadeu afirma que em paralelo com o fim dos lixões, os municípios também precisam adotar a coleta seletiva, o descarte apropriado e ações eficazes que beneficiam o meio ambiente.
Não basta encerrar o lixão e despejar o mesmo lixo no aterro sanitário. É preciso um equipamento de transformação do resíduo, com um sistema de coleta do material reciclável.
(EDUARDO TADEU, DIRETOR-EXECUTIVO ABM)
Falta apoio e diálogo
O diretor da ABM afirmou que falta diálogo com os entes responsáveis. “Essas ações e políticas precisam ser construídas em conjunto com os municípios. Vou propor que essa pauta seja discutida no Conselho da Federação”, disse.
Também questionada sobre o tema, a CNM (Confederação Nacional de Municípios) disse que durante o novo marco legal de saneamento de 2020, lutou para alterar a Política Nacional de Resíduos Sólidos, não apenas para mudar o prazo do fim dos lixões, mas também para ter apoio técnico e financeiro da União e Estados.
Segundo a CNM esse apoio é imprescindível para que o fim dos lixões seja possível.
Não obstante, a CNM evidencia que erradicar os lixões não é uma competência exclusiva dos gestores municipais, haja visto que a Constituição Federal de 1988 reconheceu expressamente, no art. 23 inciso IX, a competência comum dos Entes em promover programas de melhoria do saneamento básico, sendo que a limpeza pública e o manejo de resíduos sólidos urbanos integram os serviços de saneamento básico na legislação brasileira.
(CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS)
Para eles, é evidente que o fim dos lixões só será alcançado com “a junção de esforços da União, Estados e Municípios, conforme determina a Constituição Federal”.
“De outro modo, sem o devido apoio técnico e financeiro, os municípios continuarão avançando na implementação da coleta seletiva, inclusão de catadores, compostagem e o encerramento de lixões, mas não no tempo previsto”, afirma.
Apoio ao fim dos lixões
Assim como o Ministério do Meio Ambiente, o R7 também procurou o Ministério das Cidades, que disse que apoia os municípios brasileiros na ampliação e melhorias dos Sistemas Públicos de Manejo de Resíduos Sólidos em regiões com população superior a 50 mil habitantes ou em municípios integrantes de regiões metropolitanas.“Um exemplo é o recente anúncio do edital de mais de R$ 11 milhões para promover a estruturação e fortalecimento das redes de catadoras e catadores de materiais recicláveis em todo o país”, disse a pasta.
O Ministério também citou o Novo PAC Gestão de Resíduos Sólidos, que pretende ampliar a cobertura e a eficiência dos tratamentos dos resíduos sólidos urbanos.
O programa também incentiva ações que aumentem a cobertura de coleta seletiva regular, com participação das cooperativas de catadores de materiais recicláveis e fomenta alternativas inovadoras no uso dos resíduos. Essas ações contribuirão para a erradicação dos lixões, para o incentivo à economia circular e para o enfrentamento às mudanças climáticas.
(MINISTÉRIO DAS CIDADES)
A pasta acrescenta que, pelo PAC, o “Ministério das Cidades vai investir R$ 1 bilhão para selecionar propostas de fomento à coleta seletiva como galpão de triagem de recicláveis, compra de equipamentos de coleta seletiva e implantação de aterros sanitários”, disse.