Flávia Londres integra a Secretaria Executiva da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA). Ela estará participando como expositora do ABM Debate: Agroecologia e Segurança Alimentar nos munícipios brasileiros, webinário que acontecerá no dia 29 de setembro, das 10 às 12 h, parceria da Associação Brasileira de Municípios (ABM) com a ANA.
A ANA é um espaço de articulação e convergência entre movimentos, redes e organizações da sociedade civil brasileira engajadas em experiências concretas de promoção da agroecologia, de fortalecimento da produção familiar e de construção de alternativas sustentáveis de desenvolvimento rural. Atualmente a ANA articula vinte e três redes estaduais e regionais, que reúnem centenas de grupos, associações e organizações não governamentais em todo o país, além de quinze movimentos sociais de abrangência nacional.
Na entrevista, Londres ajuda a entender o que é a agroecologia, seu alcance e impacto político na sociedade. Além de jogar luz nas experiências que os municípios brasileiros estão implementando na área.
O que é a agroecologia?
Flávia Londres – A agroecologia propõe sistemas de produção de alimentos capazes de conservar os recursos naturais e da sociobiodiversidade. Esses sistemas são desenvolvidos valorizando os conhecimentos tradicionais, combinando-os com os conhecimentos acadêmico-científicos. Pelos riscos que representam à saúde e ao meio ambiente, as sementes transgênicas e os agrotóxicos não são utilizados na agroecologia – embora nem sempre os produtos agroecológicos sejam certificados como orgânicos.
Para além da dimensão técnica, a agroecologia carrega consigo um forte componente político. Os alimentos produzidos nesses sistemas têm por objetivo, em primeiro lugar, garantir a segurança alimentar das famílias agricultoras e suas comunidades. A agroecologia busca também valorizar os circuitos curtos de comercialização e o desenvolvimento dos territórios, gerando riquezas e fazendo-as circular localmente, em benefício das populações. A democracia, a reforma agrária, a defesa dos direitos de povos e comunidades tradicionais, a justiça ambiental, o feminismo, a luta anti-racista e anti-LBTQI+fóbica e a promoção dos direitos das juventudes são também bandeiras da agroecologia.
Constituída como um tripé que articula “ciência”, “movimento” e “prática”, a agroecologia propõe formas de produzir e viver capazes de contribuir efetivamente para a saúde do planeta e para a construção de uma sociedade mais justa.
Como os municípios brasileiros podem estruturar políticas locais sustentáveis?
Flávia Londres – A chave do sucesso para a estruturação de políticas efetivas e de impacto real sobre a qualidade de vida das populações é a participação, o diálogo entre Estado e sociedade civil. A experiência mostra que as políticas elaboradas a partir das realidades locais, das demandas levantadas junto às comunidades, inspiradas nas soluções e propostas construídas localmente, e implementadas de forma participativa, com o ativo envolvimento das comunidades e dos públicos beneficiários, são aquelas que alcançam os melhores resultados. As políticas construídas, planejadas e monitoradas com participação social também possuem, em geral, muito mais chances de se perpetuarem ao longo do tempo, ajustando-se e até aprimorando-se, mesmo quando acontecem mudanças de gestão nos municípios.
Há, hoje, experiências bem sucedidas nos municípios?
Flávia Londres – Em 2020 a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) realizou um mutirão nacional de identificação de políticas, programas e leis municipais que, em alguma dimensão, apoiam a agroecologia e promovem a soberania e segurança alimentar e nutricional (SSAN). Em pouco menos de dois meses de busca foram identificadas mais de 700 iniciativas. Uma ficha com informações resumidas sobre cada uma dessas políticas pode ser encontrada no mapa interativo que está disponível na plataforma online Agroecologia em Rede.
Neste mapa, podemos encontrar políticas de apoio a feiras da agricultura familiar, hortas urbanas e comunitárias, iniciativas que combinam a coleta de resíduos urbanos e a compostagem com o incentivo ao consumo de produtos locais com o uso de moedas sociais, políticas de combate à violência contra as mulheres, iniciativas de valorização da cultura e da memória locais, ações de comunicação popular, políticas municipais de aquisição de alimentos da agricultura familiar e distribuição a instituições de assistência social, alimentação escolar, entre muitas outras.
A ANA publicou também em 2020 um documento, intitulado “Municípios Agroecológicos e Políticas de Futuro”, que traz uma síntese dos resultados desse levantamento nacional, classificando as iniciativas em 13 campos temáticos.
A sistematização dessas iniciativas coloca em evidência o fato de que os municípios podem sim fazer muito pela agroecologia e pela promoção da soberania e segurança alimentar e nutricional. Bons exemplos não faltam.